Itapajé vive um momento de profunda inquietação literalmente e principalmente em sua política educacional.
Os últimos contratos firmados no âmbito da Secretaria de Educação, a licitação revogada e as denúncias surgidas em torno da merenda escolar colocam em xeque a condução orçamentária da pasta e os princípios que deveriam nortear qualquer política pública voltada à infância, à segurança alimentar e à formação pedagógica.
É necessário pontuar, com absoluta clareza e equilíbrio, que a gravidade dos fatos recentemente noticiados ultrapassa a esfera de erros técnicos ou escolhas administrativas infelizes.
O que se observa, a partir de documentos públicos e relatos consistentes, é a montagem de um modelo de gestão que se distancia, passo a passo, dos critérios constitucionais da legalidade, moralidade, eficiência e economicidade.
No início deste ano, foi firmado contrato com organizações da agricultura familiar, totalizando mais de oito milhões de reais, com a finalidade de fornecer alimentos à rede municipal de ensino.
Ocorre que denúncias sérias indicaram que parte do material entregue — inclusive carnes — teria chegado a uma escola em condição imprópria para o consumo.
O contrato foi, por esse motivo, suspenso temporariamente pela gestão, gerando insegurança, desabastecimento e indignação entre pais e educadores. Em vez de aprofundar medidas corretivas, outra decisão levantou novos questionamentos: a revogação de uma licitação em andamento para fornecimento de refeições sob demanda, que previa almoço ao custo de R$ 75,67 por unidade.
Embora o valor fosse elevado e merecesse revisão, a forma como a revogação ocorreu — sem ampla justificativa técnica — adicionou mais um ponto de opacidade à condução da política alimentar do município.
Agora, veio à tona a contratação de uma empresa privada, via Pregão Eletrônico, por mais de R$ 4 milhões, para execução de serviços como formação pedagógica, elaboração de cadernos didáticos e aplicação de avaliações.
O modelo de contratação, e a centralização de todos os serviços em uma única empresa suscitam dúvidas quanto à compatibilidade com os dispositivos da Lei 14.133/2021, que estabelece que serviços intelectuais especializados exigem outro tipo de processo licitatório, baseado em técnica e preço.
Não se trata aqui de atribuir culpa a agentes específicos. O que se busca, neste espaço editorial, é chamar a atenção da sociedade, das instituições de controle e dos gestores públicos para a necessidade urgente de revisão de práticas que colocam em risco a finalidade da política educacional.
A Educação não pode se tornar um balcão de contratos de ocasião. Tampouco pode se submeter a estruturas improvisadas, fragmentadas ou de planejamento superficial.
Quando crianças recebem alimentos estragados, quando escolas interrompem sua rotina por falta de merenda, quando milhões de reais são alocados sem estudos técnicos públicos, a própria legitimidade do serviço público entra em colapso. É dever do Ministério Público, dos Tribunais de Contas e da própria Câmara Municipal zelar pelo bom uso dos recursos públicos e pela integridade das políticas educacionais.
Mas é dever da imprensa — e de cada cidadão — cobrar que a Educação não seja tratada como área de repasse automático de verbas, mas como campo sagrado de formação humana e de investimentos com resultados mensuráveis.
Se tais práticas continuarem, é inevitável que o município se veja em contenciosos judiciais, bloqueios orçamentários, sanções administrativas e possivelmente responsabilizações pessoais. Mais que isso: a população corre o risco de perder o pouco que ainda resta de confiança em suas instituições.
A saída não é o silêncio nem a omissão. A saída é a transparência ativa, o respeito à legalidade e a revalorização da técnica administrativa como bússola para decisões públicas. A Educação de Itapajé precisa ser resgatada de qualquer lógica improvisada, personalista ou mercantil. Caso contrário, os danos — já visíveis — se tornarão irreversíveis